quarta-feira, 31 de março de 2010

Ponto de situação


Já estava para aqui vir há uns tempos. Vim hoje por incentivo indirecto (leva c? ou não está de acordo com o acordo?) de uma mui querida amiga!
Por vezes penso que foi mesmo pelo melhor vir trabalhar nestas condições "guantanamescas". Por motivos intrinsecamente pessoais e pelos ganhos que daí advieram. Como também pelo inconformismo e desagrado que me provoca a condição feminina no mundo islâmico. Segundo o rating feito pela Freedom House, a Argélia, figura no pódio dos países muçulmanos com melhores condições de vida no que diz respeito a: "Femmes - Où fait il bon vivre au Maghreb". É este o título de um artigo que li numa revista chamada Jeune Afrique. A Tunísia recebe o 1º posto, seguida quase em igualdade por Marrocos e Argélia. Tudo isto nota-se menos no interior onde me encontro. Sobretudo em Setif, cidade grande mais próxima de onde me encontro. Uma Wilaya com crescimento exponencial nos últimos vinte anos, sendo já a 3ª do País. Mas tecida de muita migração de gente pobre à procura de uma vida melhor. Creio que se tivesse mais liberdade de movimentos, envolver-me-ia numa luta cívica e ainda era expulso ou desapareceria para nunca mais ser encontrado. Mas sentem-se ventos de mudança. Umas coisas puxam pelas outras. Se calhar as coisas ainda vão acontecer aqui antes de acontecer qualquer coisa no Irão. Agora pelo menos uma vez por semana tento comprar e ler os jornais locais de expressão francesa. A corrupção grassa por todo o lado. O Presidente re-eleito (seleccionado), é um septuagenário, que só serve para receber o Zidane e convidá-lo para seleccionador da selecção de futebol. O segundo ópio do povo a seguir ao Islão, embora seja o primeiro mas não é porque é de livre escolha! A empresa que fiscaliza as obras públicas, DPN, viu o seu presdiente ser preso há cerca de dois meses. Caso de corrupção. O projecto no qual me encontro a trabalhar vale 30 Biliões de Euros. A Sonatrach que regulamenta e controla o negócio do petróleo tem escândalos atrás de escândalos. Greves de todos os sectores da função pública. Respiram-se ares tímidos de revolução socio-cultural. A imprensa fala claramente sobre os problemas, mete os dedos nas feridas e questiona ministros e figuras do aparelho de estado sem medos. O País segue sem rumo, espera-se uma atitude ou uma declaração do Presidente em relação a todas estas questões. O silêncio poderá ficar ensurdecedor.
Por outro lado temos uma repressão social traduzida em barreiras da "Gendarmerie National" por todas essas estradas fora. Mas não fazem mais nada, só controlar o trânsito, caçar a multa e o suborno. Coisas que já vi presencialmente, inclusive encontro num café para receber uma carta de condução apreendida a troco de 1500DNA (cerca de 15 €). O exemplo vem de cima. Estas gentes anestesiadas por anos de guerra civil e terrorismo. Reprimidas por feridas de guerras e terror fundamentalista religioso. Até quando se calarão? Até quando se contentarão com café barato, pão, batatas, futebol e tarifas económicas de telemóvel? Aguardo, com esperança. Um dia o medo vai-se e fica a fúria. A fúria dos muitos que nada têm contra os poucos que têm mais que muito!

P.S.- Para quem interesse: http://www.elwatan.com/