Como já referi em posts anteriores, perdi o meu motorista Nouredinne Sdrati. Personagem dos vídeos mais engraçados desta página. De 3 em 3 meses dá-se a rotatividade dos nossos "chauffers". Depois de fazer as minhas habituais pesquisas, tudo isto se deve ao facto de a admnistração não querer que se criem laços entre condutores e conduzidos. Uma pena, na realidade, e para quem realmente faz amigos o objectivo não se cumpre. Não só continuamos amigos do Nouredinne, como vamos sempre que podemos tomar um "tê" ou um "cahoir"( café - o h lê-se como um r não acentuado ). Amanhã vou-lhe emprestar a câmera fotográfica para tirar fotos dos seus filhos. Ofereci uma bicicleta à filhota de seis anos dele que foi a melhor aluna da 1ª classe da escola dela no ano lectivo passado. Outros presentes se seguirão. Quando somos afortunados com um bom salário ou qualquer tipo de riqueza, devemos partilhar com os que pouco têm. Penso que o dinheiro da bicicleta acabou por não ser para uma bicicleta. Terá sido sem dúvida para algo mais importante e de necessidade mais fremente. A sua família habita numa casa que partilha com o duas irmãs, uma casada, assim como com o seu pai. Ele tem um quarto na mesma, no qual co-habita com a mulher mais os três filhos. Não se consideram pobres. Tenho acompanhado a angústia dele no processo de candidatura a uma habitação social, na qual poderia viver só com os seus filhos e com a sua esposa. Já saiu a primeira lista de atribuições. O seu nome não constava da mesma. Nessa lista constava já outro Sdrati. Nunca duas pessoas da mesma família parecem na mesma lista, princípio igualitário deste governo Argelino. Não fosse o facto de o outro Sdrati ser irmão de outro Sdrati, o qual tem um bom cargo admnistrativo no Governo Local. Ça c'est la Algérie, l'Afrique, le Monde.
Agora ando com um bom rapaz, de 30 anos, que se chama Tarek Saf. Casado, com um pequeno filho e com o sonho de viver na Europa, onde já habita o seu irmão. Numa conversa de outro dia, falávamos do Ramadão, da vida, da Argélia...de tudo. Às tantas no meio da conversa, eu já gozava com ele a dizer para irmos beber uma cervejinha ao meu quarto e comer um belo naco de presunto. Fechávamos a porta e ninguém via. Rimo-nos os dois, isso seria impossível, muito mais sendo altura do Ramadão. Isso seria "aamar". Não sei se é assim que se escreve, mas não podia escrever só com um "a". Isto significa pecar. Às tantas diz-me que no fim de semana vai para uma barragem pescar. Passa lá todo o dia, apanha um peixe, tira-lhe o isco, volta a lançá-lo à água. Eu fiquei admirado, perguntei-lhe se não deveria passar o único dia de folga que tem com o seu pequeno filho e com a sua esposa. Ao que ele respondeu com um sorriso:
T: - C'est ça l'Álgérie!
J: - Então e a tua mulher?
T: - A minha mulher é livre...Senão "aamar", é livre.
J: - Então no fim de semana, está com a família, com os amigos...
T: - Amigos?? Amigos...não tem amigos?
J: - Não tem amigos????
T: - Não...vai ter com a família...
J: - Mas não pode ter amigos????
T: - Hmmm...não.... ( meio envergonhado, sorrindo ).
J: - Mas então que raio de liberdade é essa? " Mon ami, ça n'est pas être libre".
Sorriu, envergonhado, uma vez mais. eu sorri com ele abanando a cabeça a dizer que não. Seguimos em silêncio uns breves minutos...
J: "Tu aime ta femme?"
T: "Oui".
Sorrimos novamente, sem embaraço.
O irmão dele e a mãe vivem em Itália. Têm uma boa qualidade de vida lá. Andam a tentar arranjar um contrato de trabalho para ele conseguir um visto e assim se juntar a eles. Isto é um homem ao qual perguntei, que, se conseguisse ir para a Europa faria a mulher andar meia coberta. Ele respondeu que não.
Engraçado, no meu período de férias, apanhei só um pouco de um documentário que falava de uma mulher Argelina que tinha emigrado para França com o marido, penso que há mais de 20 anos. Essa mulher, divorciou-se, liberou-se e voltou à Argélia para ver como estavam as suas antigas colegas de escola. Do pouco que vi, registei uma que não podia sair de casa. quando o fazia sem o marido, não podia passar mais de 2 metros da porta de casa e não poderia lá permanecer mais de 30 a 60 segundos...
Aqui a PIDE são os vizinhos, as pessoas que comentam e desgraçam vidas só pelo facto de alguém andar de cabelo descoberto ou por ficar mais de um minuto à porta da sua própria casa. Isso desgraça o marido, os pais, os sogros, os irmãos e sabe-se lá quem mais. Mesmo com noções de justiça e liberdade... Não se pode permitir a vergonha do falatório alheio.
Carta aberta de profissionais da saúde
Há 2 horas
6 comentários:
Ai, a mim surpreende-me sempre que ainda existam tantas mulheres a viver desta forma com tal falta de liberdade. Eu acho que sou uma sortuda por ter nascido neste Portugal onde apesar de tudo vamos exigindo igualdade de direitos para os homens e para as mulheres!
Depois eu pergunto-me será que essas mulheres são felizes? É certo que elas não conheceram o mundo das liberdades mas ainda assim eu duvido muito... Mereciam mais, muito mais...
são as chamadas liberdades relativas....é livre aos olhos dele, que está rodeado de repressão. Mas olha, é melhor que nada, pelo menos tem a palavra liberdade no vocabulário...Bjs. JB
TU és uma janela aberta. Um portal. Que trabalhinho que para aqui vai. Muito bom.
Continua a arregaçar!
Grande Abraço
Meu, ou MUDAS o tamanho da fonte que usas, ou um gaijo fica estigmático antes de chegar ao 2º parágrafo!!! Por falar em 2º parágrafo, começa de uma maneira deveras, digamos, hummmm, o teu irmão sabe disso??? Ora vejamos: "Agora ando com um bom rapaz, de 30 anos, que se chama...". Mas tem mais, senão, leia-se: "Às tantas no meio da conversa, eu já gozava com ele a dizer para irmos beber uma cervejinha ao meu quarto e comer um belo naco de presunto.". Mas, MAS, não fiquemos por aqui: "Sorriu, envergonhado, uma vez mais. eu sorri com ele abanando a cabeça a dizer que não. Seguimos em silêncio uns breves minutos...". FONASSS MEU!!! KÉSTA MERDA, AHN ????
Bom, relativamente ao resto, havias de ver a África Subsahariana.... Até te passas!!!
Vá, cuidadinho com os nacos de presunto e keep the good (God) job...
Manolas, esse mwadiê ai de cima, o "devir", tem cenas espectaculares com a MINGAS, meu!!! ATÉ ME PASSEI!!!!! LIIINDOOO!!!! GANDA MINGAS!!! Eu disse que ela tinha futuro como icon urbano!! (ps: não, não tou a falar do Rui...).
Abraço Manolas, e afinal adiei a minha ida a Pt. Já não vou no Natal... Meados de Janvier... CORTIRE o frio... brrrrrrr... saudadi na muxima....
Abraço (fds, que tou a ficar repetitivo!!!)
Impressionante, texto impressionante!
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