Depois de quinze dias de férias, regressei a Tadjenanet, faz agora duas semanas. Cheguei doente e precisei de dois dias para me recompor. Prenúncio dos tempos difíceis que se aproximavam, os acontecimentos vão se sempre encaixando, por vezes só o vislumbramos ao olhar para trás.
A vida aqui ficou mais difícil. Nos quinze dias que estive ausente houve um acréscimo bastante significativo de atentados terroristas nestas terras. Consta que é normal isso suceder no mês que antecede o Ramadão, que aqui começou na segunda-feira. Que há atentados já o sabia, mas desta vez as coisas foram diferentes. A proximidade geográfica dos mesmos altera um pouco a ideia que temos dos mesmos. Sobretudo quando, desta vez, dois deles foram dirigidos ao Campo nº 4 do consórcio para o qual trabalho. No total neste momento, o consórcio é constituído por sete desses mesmos campos. O Camp 4, encontra-se a cerca de 80 kms do sítio onde me encontro, para os lados da fronteira com a Tunísia perto da cidade de Constantine. Durante dois dias seguidos, foi alvo de ataques. O primeiro, foi um ataque armado. Cerca de uma dúzia de terroristas armados atacarm com carabinas e metralhadoras o campo. Foram eficientemente rechaçados, não provocando grandes danos materiais, pela espécie de exército privado que nos protege. Balanço final, três mortos, todos eles terroristas. O segundo ataque, no dia seguinte foi diferente, talvez pela vigilância constante à volta dos campos verificou-se ineficaz pela distância a que aconteceu. A cerca de 100 metros do campo, explodiram dois carros armadilhados, provocando a morte de alguns terroristas. Talvez os próprios motoristas. Penso que um ou mais militares ficaram feridos. A informação é escassa, pescada e nunca dada de forma oficial. Penso mesmo que propositadamente escondem este tipo de novidade às pessoas que por aqui trabalham. Outros atentados houve, num deles morreram 43 pessoas.
Tudo isto criou alterações na minha rotina. A pouca liberdade que existia, mesmo contra as normas de conduta do consórcio, onde me arriscava a saídas nocturnas não autorizadas para saborear um jantar decente regado com um bom vinho argelino e umas heinekens fresquinhas nas entradas, seguido por um bom whisky à saída...acabou. Decidimos, enquanto a situação não acalma, reduzir as nossas saídas a motivos estrictamente profissionais. Contactámos a embaixada portuguesa, registando a nossa presença assim como os nossos números de telefone. Ando sempre com uma boa maquia de dinheiro no bolso, assim como os cartões de crédito e de débito. Somos três portugueses, dois no Camp 2, onde me encontro e o outro no Camp 1, a cerca de 60kms perto de Setif. Mantemos comunicação permanente, sobretudo se tivermos que fazer deslocações pouco usuais ou fora de horas.
So now, i'm really stuck at Guantanamo.
Passadas duas semanas, parece que estou aqui há dois meses. Voltei rapidamente à rotina, já é um sítio familiar, o meu quarto, as minhas secretárias (quarto e escritório), as pessoas. Não se sente o perigo... se surgir será sem aviso. De qualquer maneira, sinto-me bastante seguro. A zona onde me encontro não tem grandes registos de atentados. É um planalto, as montanhas onde se encontram mais terroristas estão bastante longe. Concentração no trabalho, manter a cabeça minimamente distraída e ir tentando encontrar um equilíbrio no meio disto tudo. No fundamentalismo e ignorância de um povo bastante fundamentalista. Na dificuldade de trabalhar com os japoneses que por vezes se mostram bastante inacessíveis. Lembra-me aquela música: " row, row your boat...safely down the stream..."
Sigo o meu caminho, neste rio tortuoso. Ciente de que chegado ao entroncamento, esta escolha foi minha. Para os que se preocupam e perguntam se não deveria sair daqui, não desisto. Se chegar um momento em que sinta medo de sair para executar as minhas funções, serei o primeiro a tomar a decisão de partir. Cumprindo sempre as minhas responsabilidades. Avisando a empresa para a qual trabalho e cumprindo o tempo estabelecido por contrato para encontrarem um substituto.
Cada vez mais acredito que as coisas não acontecem por acaso. Estou aqui por um propósito. Estou num processo de enriquecimento pessoal. Espero saber aproveitar da melhor forma as coisas boas que por aqui posso aprender. Condições adversas, falta de liberdade, privação quase total do que nós por aí tomamos como garantido. Desafio pessoal, desafio profissional.
Natal?
Há 9 horas
8 comentários:
Jakk,
Passei por aqui e fiquei impressionada, claro.
Tama conta de ti - se ficar demasiado perigoso, não estiques a corda.
Um abraço e coragem.
É preciso coragem, muita coragem. Mas também acho que nada acontece por acaso e gosto de te ver empenhado no teu enriquecimento pessoal. Só que isso só se pode fazer enquanto estivermos vivos, por isso abre a pestana e não estiques a corda. Às tantas, o teu enriquecimento pessoal pode terminar antes de terminar a obra. E não vem mal ao mundo se quiseres voltar mais cedo. Acho que só este tempo que estiveste aí já mudou muita coisa dentro de ti...não faças nada por orgulho, teimosia ou qqr um desses sentimentos que às vezes no cegam. Força e beijinhos. JB
Não menosprezando o perigo no qual te encontras mas "nós" por cá como diz a Conceição com o suposto aumento da criminalidade a qualquer momento também estamos sujeitos, ao menos por aí sabem o que vos espera...risco de carjacking com a lata que tenho duvido mas tráfico de branca nunca se sabe! lol
É certo que te encontras num sítio que desafia um pouco a "lei da sorte" mas como diz o outro "para morrer basta estar vivo!" muitos vão de férias felizes da vida nunca imaginando que regressam (por vezes sem lá chegar) com os pés para à frente!
Quanto ao desafio pessoal saberás certamente até onde deves ir, afinal és o principal "lesado" ;)
Vou mazé pra muçulmano pá...parece cus gajos têm direito a umas mordomias fixes lá no paraíso deles.Abraço J man.Stay cool...
Hás-de encontrar o que para ti está escrito nas estrelas....
BJ muito grande
Xhaina
Palavras que emocionam...
Pensamentos sentidos...
Emoções pensadas...
Pensar e sentir outra realidade...
Ao encontro de Ti aí...
Estou contigo aí...
e aqui.
JungleJane
Quando acreditamos, não se desiste...
O acaso não existe e ponto final.
Fiquei bastante preocupada contigo quando passou no telejornal o atentado na Argélia, até falei com o outro vevado e tudo mas tás RIJO, FIRME e HIRTO que nem uma barra de ferro :)
Hang on little one, everything is gonna be alright ;)
Beijinhos~
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